12 DE MARÇO – FESTA DE SÃO GREGÓRIO I, O GRANDE, PAPA, CONFESSOR E DOUTOR DA IGREJA
São Gregório, cognominado o Grande [Magno], pelo brilho das suas ações e das virtudes, nasceu em Roma, pelo ano de 540. Gordião, seu pai, era senador e gozava de considerável fortuna. Mas renunciou ao mundo, após o nascimento do filho, fez-se eclesiástico e morreu como um dos sete cardeais-diáconos que tomavam conta, cada um em seu bairro, dos pobres e dos hospitais. Sílvia, mãe do santo elevada às honras dos altares, seguiu-lhe o exemplo e consagrou-se ao serviço de Deus em um pequeno oratório.
Gregório, desde a juventude, dedicou-se aos estudos condizentes com sua posição. Tinha mais ou menos trinta anos quando foi nomeado pretor, ou primeiro magistrado de Roma. Mas, desde a infância, acostumara-se a estimar apenas as coisas do céu. Por isso, não tinha maior prazer do que entreter-se com Deus, com os santos religiosos e retirar-se para seu quarto ou qualquer igreja, para dedicar-se à oração e meditação. Após a morte do pai, fundou seis mosteiros na Sicília e um em Roma, em sua própria casa, onde ele próprio vestiu o hábito, em 573, e se entregou com ardor incrível a todos os exercícios da mortificação cristã.
Eleito abade de seu mosteiro em 584, zelava com extremo cuidado pela observação da regra. Um de seus monges, chamado Justo, havia ajuntado três peças de ouro e as guardara cuidadosamente escondidas. Mas revelou a falta, quando se viu no leito de morte. Gregório, para puni-lo de maneira exemplar, já que havia cometido uma infração contra a regra, que prescrevia espírito de pobreza, proibiu a comunidade de visitá-lo e ir rezar ao redor dele, como ordinariamente se faz, Não lhe enviou senão um sacerdote para assisti-lo e exortá-lo à penitência… Justo arrependeu-se da falta e morreu nos sentimentos da mais viva compunção. O santo abade não se detinha aí. Seu zelo pela manutenção da disciplina monástica levou a fazer o que São Macário fez em circunstâncias semelhantes. Ordenou que Justo fosse enterrado com as três peças de ouro, sob um monte de esterco. Mas como morrera arrependido, não quis privá-lo das orações da Igreja. Por isso ordenou que lhe oferecessem o santo sacrifício da missa durante trinta dias consecutivos.
Aprendamos de São Gregório, inicialmente primeiro magistrado de Roma, em seguida monge, e por fim papa, como devemos estimar à vocação religiosa. Mas aprendamos também com que fidelidade devemos responder a essa vocação e observar a regra.
Em 454 a Grã-Bretanha tinha sido invadida por um povo idólatra e bárbaro, os anglo-saxões, que fundaram sete reinos. Os antigos bretões fugiram, alguns para as montanhas, outros para o continente, refugiando-se na atual Bretanha. A idolatria voltara com os saxões e o cristianismo se fora com os antigos habitantes. Mas um dia São Gregório, quando não era senão monge, atravessou o mercado de Roma. Viu, expostos, escravos de grande beleza. Informou-se do país de procedência deles. Disseram-lhe que eram ingleses e da Grã-Bretanha. “Os ingleses são cristãos ou estão ainda nas trevas do paganismo?’ – “São ainda pagãos.” – “Que infelicidade, tornou ele, para essas criaturas tão belas, serem escravos do demônio e, pena que um exterior assim não esteia acompanhado da graça de Deus!” Imediatamente procurou o papa Bento I e pediu-lhe que enviasse pregadores do Evangelho para a Bretanha. Ele mesmo se ofereceu e partiu. Como os desígnios de Deus são admiráveis! É à piedade de um monge pelos escravos que a Inglaterra deverá sua conversão ao cristianismo.
Mas, apenas Gregório havia partido, o povo romano se agrupou ao redor do Papa, gritando todos a uma só voz: “Santo Padre, que fizestes? Destruístes Roma, ofendestes São Pedro, deixando Gregório partir”. O Papa, espantado com os gritos, enviou mensageiros atrás do missionário, para que o conduzissem à cidade. Mas o que não pôde Gregório, como monge, executa como Papa. Enviados por ele, o monge Agostinho e seus companheiros, em número de quarenta, converteram, sucessivamente os diversos reinos anglo-saxônicos. Ethelbert, o mais poderoso desses reis, que se casara com uma princesa católica de França, converteu-se por primeiro, com os súditos e, de acordo com Santo Agostinho e São Gregório, fundou bispados em Cantuária, Londres, York, e em outras cidades. Deus concedeu a Santo Agostinho o dom dos milagres, a exemplo do que acontecera no tempo dos apóstolos. Nos séculos seguintes, esse cristianismo floresceu tanto, que a Inglaterra foi denominada a ilha dos santos. E de lá saíram grandes missionários zelosos, que converteram os povos da Alemanha e do norte da Europa.
Há três séculos a Inglaterra caiu, em grande parte, no cisma e na heresia. Em nossos dias parece que Deus a olha novamente com olhos de misericórdia e parece certo que a fará entrar, de novo, na unidade da Igreja. Rezemos para que essa esperança se realize, a ilha se torne novamente a ilha dos santos e, por ela, a luz da fé alcance milhões que vivem na Ásia sob o domínio inglês. Pensemos bem que se, por nossas orações, contribuirmos para à conversão de uma só alma, teremos mais méritos diante de Deus do que se tivéssemos criado o céu e a terra.
O reino dos ostrogodos, ou gôdos do este, terminara na Itália. Mas outro povo bárbaro para lá se dirigia. Eram os lombardos, alguns arianos, outros idólatras. Os imperadores de Constantinopla tinham, por seu turno, recuperado algumas porções do país. Entretanto, não enviavam para lá magistrados, a não ser para retirar dinheiro. Viam-se famílias obrigadas a vender os filhos para pagarem os impostos. Por isso os habitantes preferiam entregar-se aos bárbaros, a ficarem sob o governo desses imperadores de Constantinopla. Estes não lhes proibiam nem permitiam defenderem-se por si mesmos. Mais. Quando os governadores imperiais faziam tratados com os lombardos, era para rompê-Ios na primeira ocasião, o que tornava os bárbaros ainda mais ferozes. Em 590, quando São Gregório foi feito papa, contra sua vontade, os lombardos sitiaram a cidade de Roma, enquanto que a peste grassava, internamente. Nós nos queixamos, às vezes, das misérias da nossa época. Há maiores na História.
Elevado à cátedra pontifícia em tão tristes circunstâncias, São Gregório tornou-se salvador da Itália inteira. Suas orações diante de Deus, sua vigilância sobre a cidade, detiveram a princípio o contágio que desolava Roma. O trigo que fez vir da Sicília trouxe a abundância, como não houvesse nenhuma autoridade temporal, ele mesmo se ocupava da defesa militar do país ameaçado pelo inimigo. Sua firmeza e previdência bastavam a tudo. Tratou da segurança das cidades. Quis que os bispos fizessem outro tanto. Não somente lhes permitiu isso, mas ainda mandou que vendessem os vasos sacros das igrejas para redimirem do cativeiro os seus diocesanos. A ferocidade dos lombardos não pôde resistir diante de tanta virtude. Duas vezes os apaziguou exasperados que estavam pela traição do governador imperial de Ravena. À rainha deles, Teodolinda, era católica. Morrendo-lhe o primeiro marido, foi permitido pelos súditos dar à coroa àquele lombardo que ela escolhesse por esposo. Agilulfo, o novo rei, por exortações de sua virtuosa esposa e do santo pontífice, voltou ao seio da Igreja com a maioria dos súditos e reconstruiu templos e mosteiros destruídos. Ao mesmo tempo, Gregório, em correspondência com todo o universo, trabalhava pela extinção dos cismas e heresias que dividiam o Oriente, pela conversão dos visigodos da Espanha e dos saxões na Inglaterra. Pregava e escrevia com maravilhosa piedade, cuidava da reforma do canto da Igreja. E em meio de tanto trabalho, encontrava-se doente continuamente, não podendo às vezes nem levantar-se do leito.
Meu Deus, sede sempre bendito pelas graças que concedestes a vosso servidor Gregório e pelos bens que por meio dele fizestes a todo o mundo. Concedei-nos algumas dessas graças, para que nós também nos santifiquemos no pouco que temos a fazer. Que digo? Pouco? Não é nada!
(Fonte: in, Vida dos Santos, Editora das Américas, Vol. IV, Padre Rohrbacher, 1959, pp. 368-374 – Texto revisto e atualizado)