CatolicismoRito Tradicional

A MAIS DIVINA DAS FAMÍLIAS

A MAIS DIVINA DAS FAMÍLIAS

Festa da Sagrada Família de Nazaré

 

Et descéndit cum eis, et venit Názareth: et erat súbditus illis. (Luc. II. 51)

“A ninguém escapa que a felicidade pública e privada depende principalmente da instituição familiar”, com estas palavras inicia o Papa Leão XIII a Carta Apostólica Neminen Fugit sobre a Sagrada Família. “A ninguém escapa”, diz o Santo Padre: todos fazemos parte de uma família, não se pode fugir disto. “A felicidade pública e privada dela depende”, continua o Papa da Humanum Genus, o modo como a família é formada e como se comporta, influencia não apenas o destino das almas sujeitas a ela, mas também o futuro da nação. É possível com a luz da razão perceber que a instituição doméstica possui uma grande missão nesta vida. Com a luz da fé pode-se constatar o papel importantíssimo que Deus a ela conferiu.

Deus inefável tudo pode, tudo conhece. A onipotência divina poderia muito facilmente ter determinado a encarnação do Verbo de Deus, a segunda pessoa da Santíssima Trindade, da forma mais direta: poderia apenas ter surgido nesta terra já encarnado e mostrado seu esplendor aos homens. Entretanto, a Sabedoria Eterna determinou o mistério da Encarnação da forma mais perfeita e mais “comum”: pela gestação e nascimento, como todos os seres humanos[1]. O Deus encarnado quis vir ao mundo no fragilíssimo corpo de uma criança. Quis sujeitar-se a uma Virgem, a Virgem das Virgens, e quis sujeitar-se a uma família: “e era-lhes submisso” (Luc. II. 51). Nosso Senhor desejou sofrer a fragilidade da humanidade e santificar a tão salutar instituição familiar, propondo à humanidade o grande modelo.

A festa da Sagrada Família, celebrada no domingo seguinte à solenidade da Epifania de Nosso Senhor, de acordo com o calendário tradicional, recorda aos cristãos o caráter espiritual e não apenas natural que a família possui. Apesar de haver registros antiquíssimos da devoção a Família de Nazaré, apenas no fim do século XIX o Papa Leão XIII escrevia a Carta Apostólica Neminem Fugit, estabelecendo a Pia Associação da Sagrada Família. No aniversário da Neminem Fugit, o Papa estabeleceu a festa da Sagrada Família, compondo seu ofício próprio. A festa foi bem recebida pelos Pontífices seguintes como um meio eficaz de trazer novamente ao povo cristão o exemplo da Sagrada Família de Nazaré e como uma restauração do verdadeiro espírito de vida familiar, obstruindo em certa medida, os males da sociedade moderna. Estes motivos levaram o Papa Bento XV a inscrever a festa no calendário universal da Igreja em 1921.

Os tempos de Bento XV e seus sucessores não foram tranquilos, abalados por duas guerras mundiais, os Pontífices viram diversas famílias serem dizimadas e os órfãos se multiplicarem. A transmissão da fé, que é passada pelo ouvido, de pais para filhos, foi interrompida e uma grande geração foi abandonada às garras dos corruptores. Quando atingiram a vida adulta, cerca de 20 anos depois do fim das guerras, vimos as catástrofes dos anos 60 e 70. Nos dias atuais essa tragédia apenas se alastrou, pois as famílias que surgiram depois das revoluções do século passado apenas passaram adiante os falsos valores que cultivaram em sua juventude. O singelo modelo da Sagrada Família, humilde e escondida em Nazaré, faz-se sem dúvidas necessário nos escombros da sociedade materialista atual.

A família cristã, seguindo as exortações de Leão XIII na encíclica Arcanum Divinae Sapientiae e de Pio XI na encíclica Casti Connubii, tem a fórmula para se aproximar da mais perfeita das famílias. Na fidelidade aos votos matrimoniais e na generosidade para com os dons de Deus encontram os casais os maiores favores da Divina Providência. Continua Leão XIII na Neminem Fugit:

“Por mais profundo que as raízes da virtude brotem no lar, por mais que as almas das crianças tenham sido informadas dos preceitos da religião através da voz e dos exemplos dos pais, tanto mais ricos abundarão os frutos no bem comum. Portanto, é de grave importância que a sociedade doméstica seja não apenas de forma santa, mas também regida por leis santas, em cuja mesma sociedade o espírito da religião e conduta da Vida Cristã sejam diligente e constantemente nutridos. Assim, certamente que o Deus misericordioso deveria determinar a realização da obra de reparação humana, pela qual o mundo aguardou por longo tempo, portanto, Ele estabeleceu e designou tudo de modo que desde o seu princípio mostraria para o mundo o sublime modelo de uma família divinamente constituída. Nisto todo homem deve contemplar o perfeito exemplo de unidade doméstica e de toda virtude e santidade. Tal foi a Sagrada Família de Nazaré, na qual, antes de resplandecer em plena luz para todas as nações, o Sol da Justiça, Cristo Nosso Senhor e Salvador levava uma vida oculta com a Virgem Maria como mãe e São José como pai adotivo. Não há dúvidas de que essas virtudes da vida familiar comum, esses atos de amor mútuo, santo proceder e práticas piedosas brilharam no mais alto grau nesta Santa Família, destinada a ser o modelo para todas as outras. Por isso, as disposições benignas da Providência moldaram essa Família de modo que todo cristão, independente de sua condição ou posição, ao voltar sua atenção para ela, pudesse encontrar nela facilmente razão e incentivo para o exercício de toda virtude.”

Os textos da Santa Missa na festa da Sagrada Família resplandecem a glória escondida, oculta daquela família de Nazaré. Ali viveu Cristo por trinta anos junto à Virgem Santíssima e São José, até seu pai adotivo ter sofrido a mais gloriosa das mortes. Pouco nos foi revelado da santidade desta trindade terrena, que da mesma forma reflete o mistério da glória da Trindade Santíssima. “Tu verdadeiramente és um Deus escondido, o Deus de Israel, o Salvador”, diz o gradual da Missa. “Os pais de Jesus O levaram a Jerusalém, a fim de que fosse apresentado ao Senhor”, diz a oração do ofertório do Próprio desta Missa.

Cristo, Modelo de Obediência

“E era-lhes submisso”, dizem as Sagradas Escrituras. “Quem era submisso? E a quem era submisso?”, questiona São Bernardo em seu sermão para este trecho do Evangelho, “Deus ao homem!”, continua. “Deus, eu repito, a quem os anjos eram submissos, a quem os Principados e Potestades verdadeiramente obedecem, era sujeito a Maria. E não apenas a Maria, mas também a José, pelo bem de Maria. Admire-se, portanto, Deus e homem, e escolha aquilo que mais maravilha: a mais amorosa condescendência do Filho ou a excessiva e grande dignidade de sua Mãe. Ambos nos admiram, ambos são maravilhosos. Que Deus deva obedecer uma mulher é humildade sem paralelo, que uma mulher deva reger sobre Deus, uma exaltação fora de comparação”. Aprendamos nós também a sermos sujeitos à Virgem Santíssima, seguindo o perfeitíssimo modelo de Nosso Senhor Jesus Cristo e que a Sagrada Família inspire e restaure as famílias católicas, mantendo-as firmes nas promessas conjugais, pelo bem da sociedade e da Santa Igreja.

 

 

[1] Note-se, porém, o mistério da Encarnação, o parto miraculoso e a Perpétua Virgindade de Nossa Senhora antes, durante e após o parto.

 

(Fonte: site Salve Maria – Congregação Mariana da Imaculada Conceição e Santo Afonso de Ligório – Manaus/AM – Destaques acrescidos)

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