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A DISCIPLINA NA VIDA ESPIRITUAL

A DISCIPLINA NA VIDA ESPIRITUAL

(imagem: wikipédia).

… A família, obra mais perfeita de Deus em seu desígnio de amor (Cf. Documentos da CNBB n. 79, 45 e 46), chegou à sua plenitude com a Sagrada Família, “exemplo mais perfeito de Igreja Doméstica para todas as gerações, evangelizadora de muitas outras famílias e do ambiente no qual estão inseridas” (Papa Paulo VI, Evangelii Nuntiandi, n. 71).

Modelo de santidade a ser imitado por toda família cristã, a Sagrada Família cultivava com muito empenho a disciplina espiritual. Nesse sentido, o papa Bento XVI, na Audiência Geral de 28 de dezembro de 2011, observou que “a casa de Nazaré é uma escola de oração, na qual se aprende a ouvir, a meditar, a compreender o significado profundo da manifestação do Filho de Deus, tendo como exemplo Maria, José e Jesus”.

Sabe-se, contudo, que ter disciplina espiritual não é tarefa simples em um mundo que reserva cada vez menos espaço aos bens espirituais. Passamos a maior parte do tempo agindo como Marta, consumidos pelas coisas do mundo e descuidados das coisas do Alto (Lc. 10,38-42). “Preocupa-se com o que pouco ou nada importa e negligencia-se o que é de toda importância. Quem se deixa absorver pelo exterior, acabará gostando de ser por ele absorvido” (Imitação de Cristo, Livro Terceiro, Capítulo XLIV, 2).

Fato é que, se pretendemos progredir espiritualmente, precisamos nos disciplinar para estar mais tempo com Deus. A disciplina é virtude a ser cultivada desde a infância e deve nortear todas as nossas relações: na família, na escola/trabalho, na Igreja. Cumpre aos pais, que tem uma gravíssima obrigação de educar a prole – e, por isso, devem ser reconhecidos como seus primeiros e principais educadores (Concílio Vaticano II) -, ensinar aos filhos o valor da disciplina, empenhando-se de modo muito especial na disciplina espiritual da família, para que consiga bem vivenciar a Palavra e tornar-se, assim, verdadeira discípula de Jesus.

Quanto mais temos disciplina espiritual, mais Cristo se torna a centralidade da nossa vida interior e mais desejamos imitá-lo. Não é outra a razão de cultivarmos a vida interior senão a de nos unirmos cada vez mais a Cristo: “aprende a deixar as coisas exteriores e a te consagrar às interiores, e verás o reino de Deus vir a ti” (Imitação de Cristo, Livro Segundo, Capítulo I,1).

Mas cumpre lembrar que “a disciplina depende evidentemente da força de vontade; e esta é fortalecida pela graça de Deus. São Paulo diz que é Deus ‘que opera em nós o querer e o fazer’ (cf. Fil. 2,13)”1. Por isso, reconheçamos humildemente que só com o auxílio divino somos capazes de progredir na vida espiritual e, assim, levar Cristo ao mundo por meio de nossas ações.

ESCUTA DA PALAVRA (1ª Carta de São Paulo aos Coríntios – 9, 24-25)

Acaso não sabeis que, no estádio, todos correm, mas um só ganha o prêmio? Correi de tal maneira que conquisteis o prêmio. Todo atleta se impõe todo tipo de disciplina. Eles assim procedem, para conseguirem uma coroa corruptível. Quanto a nós, buscamos uma coroa incorruptível! Por isso, eu corro, não como às tontas. Eu luto, não como quem golpeia o ar. Trato duramente o meu corpo e o subjugo, para não acontecer que, depois de ter proclamado a mensagem aos outros, eu mesmo seja reprovado. – Palavra do Senhor: Graças a Deus.

REFLETINDO A PALAVRA

O trecho da Carta de São Paulo que acabamos de ler inicia observando que, para conquistar o prêmio, o atleta se impõe todo tipo de disciplina (treinos, dietas, horários rígidos, etc). Se assim o é para alcançar uma coroa corruptível, a disciplina é ainda mais necessária para o cristão alcançar seu prêmio incorruptível: a salvação.

A salvação depende da santidade e a santidade depende da disciplina: “ninguém cresce na vida espiritual sem disciplina: horário para rezar, meditar, trabalhar, etc.”2. Sendo assim, cumpre a cada um realizar um bom planejamento de sua vida espiritual, definindo uma rotina de atividades voltadas o progresso espiritual, que abram a Deus o espaço que Ele merece ter em nossa vida. “Não se faz contemplação quando se tem tempo; ao invés, arranja-se tempo para estar com o Senhor, com a firme determinação de não Lho retirar durante o caminho, sejam quais forem as provações e a aridez do encontro” (Catecismo da Igreja Católica, 2710).

Esse planejamento envolve, inclusive, a marcação de dias, horários e até locais que permitam a melhor realização dos diversos exercícios espirituais. A pretexto de mantermos a espontaneidade na vida espiritual, acabamos por nos perder, pois, a todo instante, o mundo nos apresenta ocupações que são, aparentemente, bem mais atraentes do que os exercícios espirituais a que nos propomos. Então, é importante fixar metas de progresso espiritual e cumpri-las com seriedade e perseverança, para o que necessitamos da graça de Deus.

O planejamento favorece a disciplina e a disciplina favorece a vida interior, a fim de que Deus habite o íntimo da nossa alma e possamos, assim, “ser portadores de Deus, outros Cristos – assim se chamavam os primeiros cristãos -, e levar a luz, o calor e a paz de Deus ao próximo e à sociedade em que vivemos”3.

Para auxiliar no alcance da disciplina espiritual, propõe-se um pequeno “roteiro” de vida cristã na família, através da prática de exercícios espirituais que aumentam em nós a “sede de Cristo”, lembrando que, em todas as práticas espirituais, devemos escolher o momento mais favorável, sem temer as dificuldades que possam se apresentar:

1 – Oração diária – individualmente, como casal e em família, todos devem reservar momento diário para falar com Deus por meio da oração, de preferência em ambiente silencioso e recolhido que favoreça a concentração. Privilegie-se o Santo Terço, que pode ser rezado todos os dias, em casa, andando pela rua, de carro ou de ônibus, etc.

2 – Leitura diária da Palavra de Deus – a família deve reservar um momento do dia para a leitura pausada, atenta e orante da Sagrada Escritura. Deve-se sempre antes pedir a luz do Espírito Santo para bem compreender os textos sagrados, que devem ser lidos “com humildade, simplicidade e fidelidade”. (Imitação de Cristo, Livro Primeiro, Capítulo V,2).

3 – Participação na Santa Missa e demais sacramentos – a família deve participar unida da Santa Missa, ao menos nos domingos e dias de preceito, assim como buscar os demais sacramentos, em especial a confissão (sempre precedida de um bom exame de consciência).

4 – Promoção concreta de gestos de caridade na família e fora dela – a família deve exercitar o grande mandamento do amor, por meio da partilha de bens materiais e espirituais, entre si e com os demais irmãos. Esta missão inclui o trabalho profissional, os estudos e o desejável engajamento eclesial de seus membros. …

___________

  1. Felipe Aquino, “Por que precisamos aprender a ter disciplina”, https://www.pt.aleteia. org/2019/06/10/por-que-precisamos-aprender-a-ter-disciplina

  2. Felipe Aquino, “Por que precisamos aprender a ter disciplina”, https://www.pt.aleteia. org/2019/06/10/por-que-precisamos-aprender-a-ter-disciplina

  3. Francisco Faus, Para estar com Deus, p. 9

(Fonte: Círio de Nazaré Livro de Peregrinações 2021, excertos do 5º Encontro, pp. 40-46 – Com algumas pequenas adaptações ao presente post)

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