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A PREDIÇÃO DA PAIXÃO – DOMINGO DA QUINQUAGÉSIMA

(Breve meditação para este Domingo - Sequência do Santo Evangelho: Lc. 18,31-43)

(Foto: blog Pale Ideas – Tradição Católica!)

Ó Jesus, dai-me luz para compreender o mistério e o valor do sofrimento cristão.

1 – Aproximando-se a Quaresma, tempo em que predomina a lembrança das dores de Jesus, o Evangelho de hoje (Lc. 18, 31-43) anuncia-nos já a Sua Paixão. A predição é clara: «O Filho do Homem será entregue aos gentios, e será escarnecido e açoitado e cuspido; e, depois de o açoitarem, o matarão, e ressuscitará ao terceiro dia», todavia, como já de outras vezes sucedera, os Apóstolos «nada compreenderam e este discurso era para eles obscuro». Não compreenderam porque concebiam a missão de Jesus como a de um conquistador terreno, que havia de restabelecer o reino de Israel; não sonhando mais do que com triunfos e preocupados como estavam em ocuparem os primeiros lugares do novo reino, qualquer alusão à Paixão os alarmava e escandalizava.

Para os que só pensam na prosperidade e glória terrenas, a linguagem da cruz é incompreensível. Para aqueles que têm uma visão material das coisas, é muito duro entender o seu significado espiritual e particularmente o significado do sofrimento. Já S. Paulo dizia que Cristo crucificado era «escândalo para os judeus e loucura para os gentios» (I Cor. 1, 23). E Jesus, repreendendo S. Pedro que ao primeiro anúncio da Paixão tinha exclamado: «Deus tal não permita, Senhor; não te sucederá isto», dissera com energia: «Retira-te de mim, Satanás … porque não tens a sabedoria das coisas de Deus, mas das coisas dos homens» (Mt. 16, 22 e 23).

Para a sabedoria dos homens o sofrimento é loucura incompreensível, assustadora, a ponto de os fazer perder toda a confiança em Deus e de os levar a murmurar contra a Providência divina. Para a sabedoria de Deus, porém, o sofrimento é antes um meio de salvação e redenção. E assim como foi necessário que «Cristo padecesse para entrar na sua glória» (cfr. Lc. 24, 26), do mesmo modo é necessário que o cristão passe pelo crisol da dor a fim de chegar à santidade e à vida eterna.

2 – Só depois da descida do Espírito Santo os Apóstolos compreenderam plenamente o significado da Paixão de Jesus e, longe de se escandalizarem, tiveram como a maior honra, seguir e pregar a Cristo crucificado.

O olhar humano não tem luz para compreender o valor da cruz; é necessária uma nova luz, a luz do Espírito Santo. Não é sem razão que no Evangelho deste dia, logo após a profecia da Paixão, se narra a cura do cego de Jericó. Perante o mistério da dor, somos sempre um pouco cegos: quando o sofrimento nos fere no que temos de mais querido, de mais intimo, é fácil nos perdermos e andarmos às apalpadelas como os cegos, na incerteza, nas trevas. A Igreja convida-nos a renovar hoje a oração do cego, tão cheia de fé: «Jesus, filho de David, tem piedade de mim».

O mundo admira-se frequentemente dos sofrimentos dos bons, e em vez de os animar quando recorrem a Deus, procura afastá-los d’Ele, infundindo-lhes desconfiança e falsos temores. As nossas próprias paixões e a tendência inata para gozar, gritam tantas vezes dentro de nós querendo, sob mil pretextos, impedir-nos de seguir Jesus crucificado. Permaneçamos firmes na como o pobre cego que, sem se importar com a multidão que o impedia de se aproximar de Jesus, sem se deter perante as censuras dos discípulos, que o queriam fazer calar, «cada vez gritava mais», repetindo a sua prece.

Do fundo dos nossos corações elevemos ao Senhor o nosso grito: «De profundis clamo ad te, Dó mine; Dómine, audi vocem meam» (Sal. 120). Não peçamos para nos livrar do sofrimento, mas antes para sermos iluminados sobre o seu valor: «Senhor, que eu veja!». Apenas o cego recuperou a vista, correu atrás de Jesus «glorificando a Deus!». A luz sobrenatural que pedimos ao Senhor dar-nos-á a força de O seguirmos, levando após Ele a nossa cruz.

Colóquio – «Ó Filho do Pai Eterno, Jesus Cristo, Senhor nosso, verdadeiro Rei de tudo! Que deixastes no mundo que possamos herdar de Vós, nós, os Vossos descendentes? Que possuístes, Senhor meu, senão trabalhos e dores e desonras e nem sequer tivestes mais do que um madeiro para passar o trabalhoso trago da morte? Enfim, Deus meu, os que quisermos ser Vossos verdadeiros filhos e não renunciar à herança, não nos convém fugir ao padecer! Vossas armas são as cinco chagas!… E essas chagas devem ser a minha divisa, se quero herdar o Vosso Reino! Não é com descansos, nem regalos, nem honras, nem riquezas que se há de ganhar o que Ele comprou com tanto sangue. Ó gente ilustre! Abri por amor de Deus os olhos! Vede que os verdadeiros cavaleiros de Jesus Cristo e os príncipes da Sua Igreja, um S. Pedro, um S. Paulo, não levaram o caminho que levais. Pensais porventura que há de haver novo caminho para vós? Não o acrediteis» (T.J. Fd. 10, 11).

(Fonte: livro “Intimidade Divina Meditações sobre a Vida Interior para Todos os Dias do Ano”, Pe. Gabriel de Sta. M. Madalena, OCD, 2ª edição/1967, Edições Carmelitas, pp. 356-358. Texto revisto e atualizado por nós, bem como acrescentamos alguns destaques)

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