CatolicismoJesus Cristo, Sabedoria Eterna e Encarnada
FESTA DE “CORPUS CHRISTI”
FESTA DE CORPUS CHRISTI
COMO, DESDE AS ORIGENS DO CRISTIANISMO,
A IGREJA ACREDITOU, COMO HOJE,
NA PRESENÇA REAL
A Santa Eucaristia, que não é outra coisa senão Jesus Cristo sempre presente no meio dos discípulos, era considerada, desde o tempo dos Apóstolos, simplesmente como o centro e o coração de religião. Os primeiros cristãos comungavam todos os dias, e o Apóstolo São Paulo lhes reprovava algumas negligências a este respeito, lembrando em termos muito explícitos que o Pão Eucarístico é o próprio Corpo do Senhor. Eis o que ele escreve aos fieis de Corinto:
Na véspera de sua Paixão, o Senhor Jesus tomou o pão, partiu-o e o deu aos seus discípulos, dizendo: «Tomai e comei; este é o meu Corpo que será entregue por vós»; do mesmo modo, o cálice: «Tomai e bebei; este é o cálice da nova aliança em meu Sangue». É por isso que aquele que come este Pão ou bebe o cálice do Senhor indignamente, profana o Corpo e o Sangue do Senhor. Aquele que come este Pão e bebe este cálice indignamente, come e bebe sua condenação, porque profana o Corpo do Senhor. (I Cor. 11, 23-27)
Em outro lugar, São Paulo diz ainda: «O cálice da bênção que consagramos, não é a comunhão do Sangue de Cristo? E o pão que partimos, não é a comunhão do Corpo do Senhor?».
O Apóstolo São Pedro é, todo o mundo o sabe, o autor das principais orações do Cânon da Missa1: ora, esta antiga oração contém muitas passagens que manifestam grandemente a fé na presença real; entre outras há aquela, que precede imediatamente a consagração: «Recebei, ó Senhor, esta oblação, para que ela se torne para nós o Corpo e o Sangue de vosso Filho bem-amado, Nosso Senhor Jesus Cristo». Esta outra que a segue: «Nós vos suplicamos, Senhor, que vos digneis derramar todos os tipos de graças e bênçãos, nós todos que participamos deste altar e recebemos o Santíssimo Corpo e Sangue de vosso Filho».
Nos Atos do martírio do Apóstolo Santo André, irmão mais velho de São Pedro, o glorioso mártir diz a seu juiz: «Todos os dias, eu ofereço a Deus onipotente, não o sangue das cabras, nem a carne dos touros, mas o Cordeiro sem mancha, cuja Carne serve de alimento e cujo Sangue serve de bebida a todos os fieis […]. É verdadeiramente o Cristo que é oferecido em sacrifício; é verdadeiramente o Corpo de Cristo que é dado em alimento a seu povo; é seu Sangue que Ele dá a beber».
Não está claro? É possível exprimir mais formalmente a presença real do Corpo e Sangue de Jesus Cristo na Eucaristia? Isto aqui é para todos uma questão de boa-fé.
Nas mais antigas catacumbas de Roma, entre as quais muitas remontam ao tempo do próprio São Pedro, encontram-se pinturas e monumentos que atestam de uma maneira não menos evidente a fé dos primeiros cristãos na presença real.
Assim, nas catacumbas dos santos mártires Nereu e Aquiles2, que surgiram sob o imperador Domiciano, vê-se ainda, em uma capela que continha o corpo de vários mártires, uma pintura que exprime admiravelmente este belo mistério de nossa fé. Sobre o cálice cheio de vinho está colocado um pão na forma de pães sagrados, e este cálice e pão repousam sobre um peixe. Ora, todos os estudiosos, tanto protestantes co mo católicos, concordam que, durante as perseguições, os cristãos, para evitar sere descobertos, tomaram a figura de peixe como símbolo de Jesus Cristo: com efeito, em grego, as cinco letras da palavra que significa ‘peixe’ foram as iniciais das palavras: Jesus Cristo, Filho de Deus, Salvador. Esta pintura significa, pois, que o pão e o vinho do cálice são uma só e mesma coisa com Jesus Cristo, Filho de Deus, Salvador.
Na mesma catacumba, ao lado da primeira pintura, há ainda outra mais expressiva: é um sacerdote, com paramentos sacros, em pé diante de um altar, consagrando o pão e o vinho, colocados sobre o mesmo peixe misterioso. Ao lado, vê-se uma mulher em adoração. Notemos que a catacumba dos santos Nereu e Aquiles remonta ao ano 85 ou 86 da Era Cristã, apenas alguns após o martírio de São Pedro e de São Paulo3, e foi nesta mesma perseguição que o Apóstolo São João foi lançado a um caldeirão de óleo fervente, em Borne, diante da Porta Latina4.
Em outra catacumba, a de São Calisto5, vê-se a Santa Ceia pintada ao lado do altar principal; e lá, como sempre, o pão está unido ao peixe simbólico.
Enfim, encontram-se nas catacumbas mais antigas, cálices de vidro, no fundo dos quais estão representados, em ouro, de um lado a Ceia, e de outro as núpcias de Caná, onde a água foi transformada em vinho: expressão impressionante do mistério eucarístico, em que o pão e o vinho são transformados no Corpo e no Sangue do Senhor, assim como em Caná a água foi transformada em vinho.
A fé dos primeiros cristãos na presença real é, portanto, um fato estabelecido pela história e pela ciência. (…)
(Fonte: opúsculo Presença Real e os Milagres Eucarísticos, Monsenhor de Ségur, Editora Ecclesiae, tradução e notas de José Eduardo Câmara de Barros Carneiro, 2013, Cap. XI, pp. 43-46)
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1 Cânon Romano, oração litúrgica própria do sacerdote celebrante, de origem antiquíssima. No Rito Romano, foi a única oração eucarística; ainda o é na forma extraordinária do Rito Romano. Em sua forma ordinária, oriunda das reformas realizadas após o Concílio Vaticano II, é a Oração Eucarística I, de uso recomendado, pelo atual Missal Romano, para os domingos e solenidades.
2 Conhecidas como catacumbas de Domitila, na Via Ardentina em Roma, onde estes Santos foram sepultados, pois foram construídas sobre o terreno de Santa Flávia Domitila, mártir do século II. Tanto os Santos Nereu e Aquiles como Santa Flávia Domitila foram martirizados sob Dioclesiano, no século III. A nomeação de Domiciano vem do seu parentesco com Santa Flávia Domitila, que era sobrinha de Vespasiano, pai de Domiciano. Os três são venerados na Basílica dos Santos Nereu e Aquiles.
3 Uma antiga tradição coloca o Martírio de São Pedro e São Paulo no dia 29 de junho de 67, sob o imperador Nero.
4 Uma antiga tradição narra este episódio, quando, sob o imperador Domiciano, São João foi lançado em um caldeirão de óleo fervente, milagrosamente não lhe causando a morte. Em Roma, existe a Igreja de San Giovanni in Oleo, junto à Porta Latina. O Martirológio Romano celebra este fato no dia 6 de maio.
5 As Catacumbas de São Calisto, na Via Appía antiga. Toma este nome de São Calisto (✞222), preposto do papa São Zeferino (✞217) na administração do cemitério, tornando-se cemitério oficial da Igreja de Roma, motivo pleo qual inúmeros Papas da Igreja primitiva foram aqui sepultados. Aqui também foi sepultada Santa Cecília.